O Casanova do Sertão
Sob o sol sertanejo, os lábios e dedos racham tão fácil quanto a chuva se despede. Ainda assim, há quem se junte por "questão de pele". Quando se percebe já se está casado. Por acaso, destino ou "facilidade". Seu Elias bem entende dessas situações: passou por todas. Cinco vezes. Ao mesmo tempo. Encontrar o Sítio Carrancudo, zona rural de Verdejante, onde vive, não é difícil. "É pra lá, ó. Cabra macho danado", orienta um vizinho - de léguas -, à beira da estrada de barro. A poucos metros do local, um pequeno homem guia dois jumentos ao conforto de poucos - e raros - goles d'água. Paciente, demora-se, sem se incomodar com o clima invasivo que dispara o termômetro a mais de 40°C. Traz consigo um chapéu surrado, contrastando com a camisa de botões fechada até o pescoço, olhos de bordas azuis, desconfiados, e, na barra da calça, cinco chaves. Uma para cada residência, quase enfileiradas, a formar a vila onde todos carregam o seu nome ou o seu sangue.
Aos 67 anos, Elias Epifânio Bezerra faz as contas rapidamente: 51 filhos. Nos próximos meses, será também a quantidade de anos que viveu casado com Francisca Antônia, 65. Três a mais do que vive com a irmã dela, Maria Antônia, 62. É. Natural de Pau Branco, comunidade próxima ao Quilombo de Conceição das Crioulas, saiu de casa aos 14 anos, quando foi trabalhar na fazenda do pai "das Antônias". Entendia de terra, gado e galanteio. Alguns meses de conversa ao pé de ouvido, na beira da janela, e estavam prontos para fugir juntos. "Ele falava coisas bonitas. O que me conquistou? Sei não. Ele mesmo, acho", conta, envergonhada, Dona Francisca. Raiva, só sentiu três anos depois. "Quando descobri que ele tinha 'outra' foi porque minha irmã já estava grávida dele. Não tinha jeito e não ia deixar pra ela", completa. "Ele me procurou", rebate Maria Antônia. "Mulher hoje dá em cima do homem sem ele nem querer e só quer comer o dinheiro dele. Eu fiz nada", completa a irmã, cunhada e vizinha.
O defeito do galã sertanejo é também sua maior qualidade. Tem um coração grande. Acaba tendo "amor demais" para dar. Há 38 anos, recuperou Maria Antônia da Conceição, 62, de um marido ciumento, colega de trabalho dele, que a agredia. E não há algo que incomode mais Elias que um "covarde desses". "Ele disse: 'Deixe ele que eu te assumo'. Depois de um tempo, deixei", diz a mulher. Simples assim.
Com três esposas para se preocupar, jurou fidelidade. Às três. Teria mudado. Dizem que todo homem é acometido por crises de meia idade, que o tornam naturalmente atraído por mulheres mais jovens. E Elias dizia resistir. E assim teria sido, por 16 anos, apesar do que diziam "as más línguas". Pau nascido torto, acabou flagrado. De namorada de Cabrobó, a plantadora de arroz Maria Aparecida da Silva, 42, virou esposa. Arrumou as malas e se mudou para Verdejante. "Eu já estava 'na dança', fazer o quê?", recorda. Duas décadas mais jovem que as demais, não se sentia bem na vila que se tornou a fazenda de Elias. A casa, até hoje, é um pouco afastada das outras, enfileiradas. Buscando companhia, trouxe a irmã, Francisca Lira da Silva, 38, para viver com ela. Foi o "erro". Em um mês, a visitante também virou companheira.
A confusão dos filhos, com o tempo, vira diversão. Nem mesmo o fato de, vez por outra, o pai - e, ao mesmo tempo, tio - esquecer do nome dos 56 netos e 10 bisnetos os incomoda. Domingo é o dia sagrado de reunião familiar. Pouco a pouco, vão chegando vans lotadas de Petrolina, Pesqueira e São José do Belmonte. "O velho já está com namorada lá", ri alto um filho. Todos os descendentes de Elias, até então, são monógamos. A inspiração no pai é de outra forma. Questionado, o galã sorri encabulado, põe a mão no chapéu e balança a cabeça. "A gente ainda dá um jeito de 'tudo' funcionar. Tem que manter as esposas satisfeitas", afirma ele. O diferencial desse sertanejo é o mais simples dos segredos e pouco comum por essas bandas: "Mulher quer um homem com pulso do lado, mas ela gosta é de ser tratada bem".