A única relíquia de um passado doloroso

Ela nunca conheceu os pais. Apega-se aos traços de uma fotografia antiga. Nela, o rosto de uma mulher no qual se reconhece. Valdilene Tavares da Silva foi criada no Instituto Guararapes e, tudo o que tem da mãe, é um retrato que guarda com o amor que gostaria de ter dado e recebido. "Dizem que ela era a mulher mais bonita daquele hospital. Era linda mesmo", fala, mostrando a imagem de cores fortes de uma jovem com olhar sério e cabelos castanho escuro.

Crédito: Teresa Maia/DP/D.A.Press

"Vinha visita pro pessoal lá e me perguntava porque eu não tinha família. No colégio, eu não sabia se tinha mãe ou pai. Não sabia de onde tinha vindo. Aos 10 anos foi que soube que eu era da Mirueira e que tinha vários irmãos. Só de mãe eram cinco e de pai dez. Até hoje não sei quantos estavam no educandário na mesma época que eu. Tenho contato só com duas, mas não tenho intimidade com elas porque não fomos criadas juntas. Nunca tive carinho no colégio. Eu não lembro nem quando fiquei moça. Sai com 16 anos para a casa de uma irmã que não conhecia. Fiz minhas malas chorando. Depois, ela não me quis mais lá e eu fui viver na rua. Ia para Boa Viagem pedir dinheiro lá. Tinha 17 anos. Às vezes passava o dia todo sem comer nada. Foram uns quatro anos assim. Eu saia com um e com outro na praia para ganhar dinheiro. Eu não sei como saí com homens que não conhecia. Aí comecei a procurar emprego com os porteiros. Foi quando eu conheci uma senhora e passei quase 11 anos trabalhando para ela. Ela foi morar no estrangeiro e eu voltei para a Várzea. Foi quando conheci meu marido. Engraçado é que ele levava pão para o instituto na mesma época que eu estava lá. Era o mestre de uma padaria e eu não conhecia ele. A gente casou, eu comecei a estudar. Agora estou no segundo ano. Quero me formar. Às vezes, quando fico sozinha, lembro de como era no colégio, quando eu era pequena. Lembro muito quando passo lá pela frente. Quando eu era criança imaginava como seria se eu tivesse mãe. Até hoje sinto essa tristeza. Meu sonho era ter alguém para me levar dali e me criar. Hoje meu sonho é ser mãe. O médico disse que eu não posso ter filho. Deve ser por causa do tempo que eu saia com um e com outro. Então penso em adotar. Tenho vontade de ir num orfanato, procurar uma criança para criar, para me chamar de mãe e ao meu marido de pai. Seria o maior presente".

Expediente

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